Um banquete na rua

Publicado em 01/04/10 pelo Curitiba Cultura

Estreou ontem a peça Amoradores de Rua. Ambientada no entorno do prédio da Universidade Federal do Paraná (Reitoria), a encenação expressa o convívio de pessoas que adotaram a rua como um lar. Diferente destas duas primeiras linhas, não há nada de convencional na peça. Antes dos detalhes, um adendo: vale conferir a ficha técnica e espiar o blog (amoradores.blogspot.com) pois o grupo é digno de nota.

Os que não ficam aturdidos com as cenas podem rir. A graça é irônica e o choque é trágico. Afinal, a rua é chocante aos olhos do hipócrita, pois ela é o convívio comum e o intimo dos nossos dias transmutado na encenação do dia-a-dia. Não há nada ali que não seja cotidiano e comum, resguardado o pitoresco, expressão poética do humano em conflito com o ser. Mas tudo isso é pouco, pois perdido em cada esquina há um devorador de gente.

“A luta entre o que se chamaria Incriado e a Criatura – ilustrada pela contradição permanente do homem e o seu Tabu. O amor cotidiano e o modusvivendi capitalista. Antropofagia. Absorção do inimigo sacro. Para transformá-lo em totem. A humana aventura. A terrena finalidade. Porém, só as puras elites conseguiram realizar a antropofagia carnal, que traz em si o mais alto sentido da vida e evita todos os males identificados por Freud, males catequistas. O que se dá não é uma sublimação do instinto sexual. É a escala termométrica do instinto antropofágico. De carnal, ele se torna eletivo e cria a amizade. Afetivo, o amor. Especulativo, a ciência. Desvia-se e transfere-se. Chegamos ao aviltamento. A baixa antropofagia aglomerada nos pecados de catecismo – a inveja, a usura, a calúnia, o assassinato. Peste dos chamados povos cultos e cristianizados, é contra ela que estamos agindo. Antropófagos.”

Explico: em tudo há amor e humor. Todas as falas são repletas desses dois sentimentos universais e que parecem traduzir a própria condição de existir. Assim como esta matéria engole o trecho do Manisfesto Antropofágico de autoria do escritor Oswald de Andrade(entre aspas), repetidas vezes o Manifesto é fala dos atores. Sem delongas, destaco a mixagem sonora e o cenário, referências digeridas e incorporadas no corpo do espetáculo. Reitero: vale a conferida no blog, para saber dos detalhes.

Aliás, tudo explicadinho, tim-tim por tim-tim, não. Tem que conferir. (...) Desejo-lhes muita fome e um bom apetite!

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